quarta-feira, 16 de maio de 2012

Compras


Essa é a característica que separa alguém que terá facilidade em se alimentar bem, e alguém que sempre toma isso como uma obrigação pavorosa.
Eu simplesmente adoro entrar em um supermercado. E os pequenos, então? Pode ser um daqueles mercadinhos charmosos, de coisas caras, chiquérrimas, como endívias, estragão fresco, molho de ostra e outras loucuras assim, ou uma venda de vila, onde você pode encontrar pinhão e jabuticaba vendidos na medida de latas ou amendoim com casca na prateleira ao lado da banha de fazer sabão ou da espiral de espantar pernilongos. Perco a noção do tempo num lugar assim.
O bom senso ao pensar numa receita e o cuidado na compra dos ingredientes fazem toda a diferença para uma alimentação de boa qualidade no sentido mais amplo da expressão. Nas receitas dificilmente você terá todos os detalhes sobre os ingredientes: existe uma infinidade de tipos de tomates, laranjas, bananas, farinhas de mandioca, mandiocas, batatas, e um nhoque com molho de tomates pode ser uma refeição soberba, digna de qualquer mesa ou uma meleca disforme com um molho meio esverdeado, dependendo do tipo de ingredientes que você usar. E olha só que interessante: a batata e o tomate errados para o nhoque são perfeitos para uma salada de atum! Pense nisso, quando falo em saber comprar não é aquela coisa óbvia de escolher o insumo em bom estado e descartar o cheio de pontos escuros ou mofo: estou falando em escolher o ingrediente certo para aquela preparação. Isso a gente só aprende fazendo bastante e errando algumas vezes.
Encontre alegria em ir ao mercado, pois só assim poderá encontrar a alegria de comer uma comida saudável, saborosa e feita sem estresse. Não dá pra ser a parte chata da coisa, compreende?
Meu ex-marido sempre apreciou e se entusiasmou com o meu amor pela cozinha. Porém, as tentativas dele sempre foram meio frustradas, muita teoria e bastante bagunça na prática. Seguidas de frustração, quase sempre. Até o dia que ele resolveu aprender a fazer molho de tomates. Ele ama tomates, especialmente quando servidos quentes. Então, numa das noites em que trabalhava até tarde e ele era responsável pelo jantar, entrou na internet, procurou a receita, foi no mercadinho do nosso amigo Adilson e comprou cuidadosamente os tomates do seu molho. Que ficou espetacular. A aí o Marco começou a desenvolver esta técnica de fazer molho de tomate: ora picado, ora batido, ora mais maduros ora menos, e dá pra ver o brilho de alegria nos seus olhos com a sua culinária. Porque só é a nossa culinária se dominamos tudo, desde a escolha dos ingredientes, não é?
Então meu querido leitor, feche essa janela e vá passear na feira, no supermercado, observe tudo, veja alimentos novos, converse com aquela pessoa que está demorando para escolher as laranjas, observe as diferenças entre os bifes de contrafilé, leia os rótulos, apalpe.
Mas atenção: não aperte, não fique quebrando as pontas do quiabo ou da vagem, não prove as frutas sem lavar, seja correto com quem vende e com a sua saúde na hora das compras. Outra coisa muito feia é quando você escolhe alguma comida que fica sob refrigeração, chega no caixa e desiste da compra, largando o alimento ali, na temperatura ambiente. Das duas uma: ou o supermercado devolve aquele alimento na prateleira e um coitado que não tem nada a ver com isso compra comida estragada, ou a empresa descarta este alimento e tem que cobrar mais caro pois há uma perda grande com estes distraídos. Não tem problema desistir da compra, vc tem todo o direito, mas devolva o alimento no lugar, ou pelo menos coloque-o em algum refrigerador por perto.
Se a sua aversão às compras for insuperável, encontre um parceiro. Que ame ir ao mercado.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Preparando...

Cozinhar bem não precisa de muito espaço e nem de muito equipamento. Mas penso que para evoluir bem, um mínimo de estrutura e familiaridade são importantes. Não tem coisa pior do que ir cozinhar na casa de alguém onde não acha nada, as facas não cortam e vc não consegue achar uma peneira bem na hora que precisa. Aí você que tem a maior fama de cozinheira porreta, dá o maior vexame, e nem pode dizer que a culpa é do dono da casa!
Uma cozinha legal precisa de muita luz, não só para facilitar a higiene dos alimentos, como para dar um astral bom em quem está lá. Porque é no meio do processo que aparecem os toques pessoais, a criatividade. Eu não sou, e a grande maioria de nós não é Atala, Adrià ou Ducasse. Nós não temos a técnica, então devemos apurar algum tipo de instinto, que certamente precisa de luz para aflorar.
Pias: uma pia grande é uma coisa meio traiçoeira, é fácil ir juntando um monte de louça pra lavar, e no final agente meio que não sabe o que fazer com aquilo, dá vontade de chorar, de dormir, de sei lá. Pia grande é como limite de cheque especial: você tem de ser muito maduro para lidar com ela.
Então, já que vc tem uma pia pequena, vai precisar aprender um fundamento básico das escolas de cozinha: montar a praça. Sabe aquele programa de culinária em que o cozinheiro só vai pegando os potinhos com tudo picado e medido, e em 10 minutos prepara aquele prato que você demora 4 horas e meia pra fazer? Este conjunto de potinhos se chama praça, parece uma frescura mas é um coadjuvante essencial numa receita de sucesso: primeiro que com a praça o perigo de esquecer de alguma coisa cai a quase zero; além disso você não corre o risco de perder o timing da receita, que é uma das coisas que faz diferença. Já viveu aquela situação onde está na hora de adicionar o salsão picado, mas você ainda está tirando a terra dos talos? Das duas uma: ou vai ter salsão duro na sua receita, ou você vai servir terra com o jantar. Então, tenha muitos potinhos para a sua cozinha, se possível de vidro, louça ou inox (que são mais fáceis de lavar e não ficam com cheiro ruim), e sempre que for fazer qualquer coisa, monte a sua praça, mesmo que seja uma pracinha pequena.
Potinhos são muito importantes, ok?
Tábuas também. Que nem são mais tábuas, são placas, de plástico ou de vidro, e aí como nutricionista afirmo que nessa hora não devemos ser saudosistas e nem “vintage”: a placa de madeira é um Jardim Zoológico de bactérias, e os convidados do Oliver só não têm uma big dor de barriga porque têm um ácido muito bom no estômago. As placas de acetato ou de silicone são as mais indicadas, as de vidro são as mais charmosas e higiênicas, mas só valem a pena se você tiver um ótimo amolador de facas, porque o vidro acaba com o fio de todas elas.
Panelas são legais, mas no meu mundo classe média, está tudo bem um bom conjunto de alumínio. Lógico que vc não vai ficar raspando uma colher de metal no fundo delas, mas é melhor um alumínio decente do que um conjunto antiaderente ou esmaltado da promoção, sabe qual? Isso pode ser “despeito” de quem não tem grana para comprar uma Le Creuset, mas as panelas estão na última metade da minha lista de desejos. Exceto uma Wok, que ganhei da Elvira Alegre.
É claro que cozinhar começa com um bom fogo. Desde a pré história é assim. Precisamos de um fogo baixo baixo e um fogo alto alto, assim como devemos sussurrrar em alguns momentos e gritar em outros. Um bom fogão encabeça minha lista de desejos: uma boca grande e forte, um forno grande, duas prateleiras dentro e um dourador, ai meu Deus, não sei se mereço!
Em segundo lugar, uma mesa de pedra, nem que seja pequena: fácil de limpar, boa de preparar massas, boa para colocar a assadeira que saiu do forno e para esfriar aquela bala de chocolate que não faço há séculos. Foi um desejo passado pela Dona Neca, nossa vizinha desde sempre, que quando realizou o sonho de fazer sua casa na chácara comentou com a minha mãe todos os significados da grande mesa de pedra na sua cozinha. Fiquei com saudades dela agora...
Adoro também o mixer elétrico, que me permitiu inventar um Barreado de mentira que faz o maior sucesso aqui em casa. Além de ser muito mais fácil de lavar que um liquidificador, pode ser usado nas panelas que estão no fogo, e assim salvar um molho branco empelotado, um feijão que não quer engrossar, ou um ensopado que precisa virar sopa. Esse é perfeito!
E para dar um toque de sofisticação nesta conversa, quero falar da delícia de ter um chinois na sua cozinha. Chinois é uma peneira em formato de um cone cilíndrico invertido, que lembra um chapéu chinês, geralmente feito de aço inoxidável e é sensacional, porque peneira muito rápido e todo o líquido peneirado converge para o “biquinho” da peneira, facilitando e aclerando muito o seu trabalho. O meu tem mais de 25 anos, serve de peneira, coador e escorredor, é uma frescura que vale muito a pena.
Facas bem afiadas, sem discussão. O que pode mudar, de acordo com a habilidade, é o tamanho delas. E quanto à variedade? Uma grande, duas pequenas: uma de corte e uma de serra, é o básico, o resto é bem-vindo. Aí chegam as colheres, escumadeiras, mexedores e tudo mais. Ainda não encontrei nada tão gostoso como a colher de pau, mas é meio irresponsável aconselhar seu uso. Se quiser muito usar, troque-as com muita frequência. Silicone ou qualquer outro material resistente ao calor e que não risque as panelas é o indicado. Cuidado com coisa muito barata, que pode derreter, descascar ou liberar disfarçadamente alguma toxina chinesa...
Pronto! Equipamento checado, vamos ao próximo passo.